Apesar da grita em relação ao câmbio – principalmente em função da perda de competitividade das exportações – o dólar baixo também tem efeitos positivos para a economia, especialmente sobre a inflação. De acordo com o índice CRB Alimentação, que reúne as cotações de commodities alimentícias na Bolsa de Chicago, os preços já subiram 23% em dólares de julho até a última terça-feira. Em reais, devido ao fortalecimento da moeda brasileira, a alta foi de 14%.
A economista do banco Santander Tatiana Pinheiro lembra que o grupo alimentação tem influência relevante nos principais indicadores de preços brasileiros.
No IPCA, referência para a fixação de metas de inflação, o grupo Alimentação e Bebidas representa 22,7% do cálculo. No IPC da Fundação Getúlio Vargas, os alimentos ficam coma segunda maior importância, de 28%. "O fato de o real estar se valorizando suaviza, sim, parte do efeito da alta do dólar sobre a inflação. Mas não é suficiente para segurar o índice", observa. Ela prevê IPCA de 0,44% em setembro, a ser divulgado hoje pelo IBGE, e de 5,5% em 2010.
O economista da FGV André Braz também enxerga um efeito positivo do fortalecimento do real sobre a inflação. Recentemente, um problema global na oferta do trigo fez os preços dispararem.
Na última medição do IPC, que ficou em0,46% em setembro, o trigo teve alta de 5,64%. "Se o dólar estivesse alto, teríamos que desembolsar mais reais para comprar quantidade igual. E teríamos dois efeitos ruins para a inflação: a menor oferta, que aumentou o preço em dólares, e a desvalorização do real", explica.
Outro benefício de um dólar mais fraco é o aumento das importações de bens de capital para a modernização da indústria. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (Abracex) estima que a idade média de máquinas e equipamentos no Brasil é 17 anos (ou seja, usam tecnologia de mais de duas décadas), bem acima da média mundial.
"Seria um bom momento para a gente se modernizar e conseguir produzir com menor custo e mais tecnologia", diz Roberto Segatti, presidente da entidade.
Ele critica o fato de o governo não incentivar essas importações: "Até setembro, o Brasil tinha importado US$ 25 bilhões em máquinas e equipamentos, que é um número interessante, mas a necessidade é bem maior.
Hoje, os tributos incidem sobre a a importação de equipamentos". O lado perverso do real valorizado é a redução da competitividade de produtos feitos no Brasil, que sofrem com o aumento das importações e se tornam mais caros para o comprador externo.
O economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério Souza, lembra que o faturamento industrial caiu 0,3% em agosto.
"É pouco, mas se as vendas estão caindo, pode ser por conta de ajuste de estoques, mas também devido a um achatamento de preços devido à competição dos importados", observa. Em alguns setores, como têxtil e calçadista, os empresários já preferem importar o produto final. Em agosto, a produção industrial de bens de consumo semi e não duráveis caiu 0,8% frente a julho. Entre os destaques de queda estavam têxteis (0,7%), vestuário (-0,6%), calçados (2,5%) emadeira (-3,5%). "Você cria uma relação com fornecedores lá fora, toma financiamentos para importação e acaba criando uma rede que, se for cristalizada, representará maiores entraves para retomar a produção interna depois", diz.
Para o economista-chefe da LCA, Francisco Pessoa, o empresariado não se mobiliza por questões que vão além do câmbio.
"Os problemas de tributação e falta de infraestrutura estão aí há anos. Empresário também não gosta de juro alto. Mas se o dólar começasse a subir não seria possível baixar os juros porque teria impacto na inflação", diz. Com o juro alto, o ambiente continuaria favorável à arbitragem (atração de estrangeiros em busca da maior rentabilidade da Selic).
Parte do que sofremos nas exportações tem a ver com a política de não intervenção. É um discurso bom para economista neoliberal, mas na prática nenhum país cumpre. Outro problema é que as exportações brasileiras são essencialmente de produtos primários, as famosas commodities, com baixo valor agregado. Além disso, parece que os empresários brasileiros não são muito bons em atuação política.